Ok, vou enfim contar como foram os últimos dias na Índia, e finalizar o que rolou no país, afinal de contas, another month another boarder, e eu já estou no Nepal.
Voltando do curso de meditação em direção à Delhi eu tava bem desanimado... eu queria ter ficado naquela paz por mais um tempão antes de sair de novo pro caos que é a India, mesmo sendo Daramsala um ponto dos mais calmos que eu vi. Mas tinha já combinado de encontrar o Bunito, então comprei logo a passagem e embarquei.
Agora eu não tava mais sozinho e devo confessar que de viajar sozinho vc fica bastante mimado consigo mesmo. Ter que explicar o que eu queria fazer pra mais uma pessoa e mais que isso ter que conciliar as vontades se torna um saco... e olha que era praticamente exatamente os mesmos planos... mas enfim, sem problemas conseguimos concordar em ir pra Agra, passar uma noite lá, depois de ver o Taj Mahal já embarcar no mesmo dia pra Varanasi, depois de ficar lá uma noite, embarcar pra Sonali e ir pra Pokhara no Nepal.
Fizemos isso pela primeira vez através de um "pacote". O Bunito tava ainda horrorizado com a India e eu não tava também muito afim de ficar enfrentando fila pra comprar passagem, indo de hotel em hotel pra achar um bom, e então fechamos com uma agência "governamental" de turismo. O preço nem foi tão caro pq os hotéis eram bem bons, mas em geral eu acho que não vale a pena... é melhor ir na cara e na coragem que vc economiza mais e fica mais exposto aos prós e contras do acaso, que no final das contas é o mais legal de tudo.
Aí fomos ver o Taj Mahal e nem isso me animava... eu só queria ficar de bobeira sem fazer nada filosofando... mas só de ver aquela cupula branca no horizonte pela janela do hotel pela primeira vez já me deu um gás. Chegando lá é realmente sensacional o negócio. Sem dúvida uma das construções mais bonitas que eu vi na vida...
Mááás, qualquer beleza por mais linda que seja tá sempre muito subjulgada ao poder que ela tem de bater dentro de cada um e dar aquele sentimento bom, legal... tipo um casal que se ama olha um pra cara do outro e por mais feio que seja eles podem continuar olhando o tempo que quiserem. O Taj Mahal não teve essa força em mim... nem de perto. Era realmente fabuloso e vc olhava aquela coisa enorme tudo de mármore na sua frente e os jardins ao lado bem bonitos, com mesquitas enormes completando a cena, tudo lindo, mas não sei... talvez pq tava lotado e num tinha um segundo sem ouvir um berro, talvez pq sei lá mesmo, não foi marcante o suficiente pra chamar aquilo de uma das 7 maravilhas do mundo. Já estive em inúmeros lugares que me impressionaram muito mais, aqui na Índia mesmo, as cavernas de Ajanta, formavam um complexo que como um todo eu achei bem mais legal que o complexo do Taj Mahal. Eu percebi isso só depois, olhando as fotos e relembrando... na hora eu achei tudo muito legal, mas saindo do complexo já tava meio "desapontado".
Mas isso deve ser de cada um pra cada um e eu obviamente recomendo a visita. Num tem nada de simples, é na verdade magnífico, mas ficou faltando aquele algo mais... por exemplo quem já foi pra Machu Picchu e sentiu a vibe sabe do que eu to falando... nem precisa ir tão longe... pensa em qualquer mirante no meio de uma montanha na costa, onde de repente a gente ve o mar... pensa na cachoeira do tabuleiro... pensa na vista da guanabara de cima do cristo redentor...
Beleza, vamo pra Varanasi, a cidade do Ganges, onde queimam os corpos na beira do rio. Só um PEQUENO problema: no trem, eu e o Bunito capotamos na noite e passaram a mão na mochila dele e levaram tudo: laptop com menos de 1 mes de uso, celular, iPod, carteira com um pouco de dinheiro e os preciosos cartões, e pior de tudo, o passaporte. A gente tava pra sair do país em 2 dias e ele perdeu o passaporte. Nem precisa falar como ele ficou puto! Deu uma problemada do caralho, veio a polícia mais incompetente que um pau mole na hora H, e ficou claro que num tinha jeito: teríamos que voltar pra Delhi e ir pra embaixada pegar outro passaporte. Nessa hora eu percebi também o quanto é incrível a capacidade das pessoas de se comunicarem, e como é desesperador quando a gente não consegue ser compreendido e esquece de tentar compreender. O delegado não falava inglês, o Bunito tava em choque... ficava um gritando palavras soltas pro outro ninguém entendendo nada, a situação não indo pra lugar nenhum... lembrei de um filme que quando eu vi odiei, Babel, e dei um pouco mais de crédito pra ele...
Depois de um monte de telefonema, fomos dormir de saco cheio ainda, e chegou o dilema. O Bunito não queria ir pro Nepal depois de voltar pra Delhi, pq não queria passar o perrengue de 3 pra ir e mais 3 dias dentro de busão e trem pra voltar... mas eu não tava afim de pular o Nepal nem fudeno, e então resolvemos separar. A gente encontrou uma francesinha que deixou a mochila dela cair do trem e tava na mesma situação que o Bunito, então eles dois voltariam juntos e o fabito ia ter alguém pra bater papo pelo menos, então decidi ir mesmo pro Nepal e encontrar o Fabito de novo do outro lado, no sudeste da Ásia, no Laos ou Thailandia.
Aí compramos os bilhetes e fomos passear na cidade. Demos de cara com uns becos sinistros, e a gente não conseguia achar o rio de jeito nenhum, e ninguém entendia nada que a gente falava... mas se falasse "Gangaaa" com um sotaque esquisito nego entendia o que vc queria e te apontava o "caminho" até vc se perder denovo na próxima encruzilhada, que ficava uns 10 passos na frente. O mais bizarro é que quando vc chega é só um rio feio pa caralho sem nada demais, e cada vez que vc chega mais perto o fedor é mais forte. Fede tanto que vc pode respirar pela boca que vc sente do mesmo jeito... é de dar náuseas.
Mas caminhando pelos portos na beira do rio vc fica mais calmo do que estava nos becos e se torna interessante. O povo jogando criquet por exemplo: toda hora a bolinha sai voado pra água e alguém tem que nadar naquela porcaria pra ir buscar. Teve uma hora que a gente tava meio parado e um moleque começou a gritar pra gente, aí a gente olhou e ele tava meio que mandando a gente sair da frente. Porque? Tinha uma vaca caminhando em nossa direção e a gente tinha que sair da frente pra ela não ter que desviar... eita nóis...
Falar em vacas, hoje eu recebi um email do Playboy, que tá em Varanasi agora, e contou um caso incrível! Algo mais ou menos assim:
"quase esqueci, mas outra dica muito importante eh sempre olhar para cima quando estiverem andando por becos ou ruelas, pois ontem uma vaca caiu do telhado do nosso hotel e se espatifou no chao!!!!! e tao logo ela acabou de agonizar, jogaram a bixona diretamente no rio! no mesmo q eles jogam os cadaveres e cinzas das pessoas mortas, que eles se banham e bebem agua........."
Aí dobrando uma esquininha eu vejo um monte de tora de madeira... um cara cortando mais e mais madeira, e percebo uma fumacinha no ar. Rapidinho vc percebe que estão fazendo cremações. Deu pra perceber que se a gente descesse uma escadinha ia dar pra ver direito o que tava rolando, e então a gente foi.
Nu, a cena é muito forte. Tinha umas 5 a 10 "fogueiras" a 5 metros da gente. Eles pedem pra não tirar fotos, então eu respeitei e na verdade nem precisa. De bater o olho a imagem já gruda na mente e não tem como apagar mais. Lembro direitinho do que vi... é muito estranho... eles fazem uma fogueira bem do tipo das festas juninas do Brasil e o corpo não fica em cima, mas sim no meio. Tem madeira em baixo e em cima dele também, então ele fica bem no meio das chamas. Tem um pano por cima do corpo, mas dá pra ver nitidamente os contornos, e rapidinho queima o pano e se pode ver até as feições se desmanchando. Lembro que o que estava mais perto da gente tinha a cabeça um pouco deitada para trás e a boca aberta numa pose quase de alívio meio que dizendo "arhhhh" naquele som gutural. Isso porque eu olhei por 2 segundos antes de vir essa imagem na minha cabeça... saímos e contornamos, mas pensei que se alguma coisa me provocava tanto eu tinha que alimentar ela e "estudar" o que eu tava sentindo, então resolvi descer de novo... aí fiquei olhando a cena por um minuto talvez, vendo como o povo ao lado está completamente normal, quase apático, ninguém aparenta estar triste... como pouco a pouco uma nova fogueira ia acendendo, e como ia sendo consumido o corpo daquele que eu tinha olhado primeiro. Algumas pessoas, de cabeça raspada e com um terceiro olho bem grande no meio da testa, vestidas com panos brancos tipo o Gandhi, ficavam próximas, alimentando as chamas com uma gosma amarela. A pessoa vinha com um pincel e passava um tipo de gordura na face, nos pés, e na madeira ao redor do tronco do corpo e ligeiramente as chamas iam avançando. Nossa, muito forte... de escrever eu já fico de cara com a imagem que vem na minha cabeça...
Quem já cuidou de uma foguira sabe que chega um momento em que a madeira cede e a estrutura da fogueira vem abaixo. O fogo continua o mesmo, mas a fogueira caiu. Imagina essa cena quando tem um corpo dentro da fogueira. (vcs estão arrepiados? imagina eu?)
Só não pude ver o final da cerimonia, quando jogam as cinzas e os restos no rio...
e também veio o Sósia depois e falou no email sobre o passeio de barco no rio:
"Ah, e eh limpinho esse tal de ganges eh???? Acabamos de dar uma volta de barquim lah, e vimos o corpo de uma criana boiando.... :S"
Isso é porque tem alguns critérios que fazem com que o corpo não possa ser cremado... os exemplos que me falaram foi uma mulher grávida ou uma morte por picada de cobra, mas não sei o quanto é verdade a informação, mas o fato é que todo mundo ve corpos boiando na água...
Ok, chega... o Bunito tinha que ir embora e eu já tinha alimentado minha angústia o suficiente pra tentar confrontá-la e ser derrotado, então resolvemos ir embora. Pegamos um taxi, fomos pro hotel onde estavam nossas malas e ali me despedi do Bunito.
Tem um detalhe no hotel. O Bunito estava evitando de gastar qualquer centavo por causa do roubo, e falou no hotel que não tinha um puto sequer, contando toda a estória. Aí o gerente do hotel deu pra ele internet de graça, fax pro Brasil e ainda arrumou 3 sanduíches muito bons pra gente. Era um hotel 5 estrelas, o Radisson Varanasi. E mais, no outro dia um outro gerente, sabendo da situação quando viemos deixar as malas falou que não podia dar cafe da manha já que não éramos hóspedes, mas que não queria que o Bunito ficasse com uma imagem negativa da India e deu pra ele 1000 rúpias! Isso são mais que 20 dólares! Num país probre como a Índia é não tem nem que comentar que era certamente muito pro cara, que nem era "gereeeente" mesmo, era tipo um conselheiro pros turistas. O Bunito fico de cara e aí a gente escreveu uma carta pra direção elogiando muito o serviço do pessoal da frente do hotel... era a única coisa que a gente podia fazer pra agradecer a atenção impagável que a gente recebeu.
Então me despedi do Bunito na porta do hotel onde fiquei por mais umas duas horas esperando a hora do meu trem, pra não ter que ir pra ferroviária ficar aguentando os mosquitos e o fedor e o barulho hehehe
Trem de umas 7 horas india time, umas 10 no tempo real, sem ar condicionado e com a maior quantidade de moscas e grilos que já vi na vida... pela manhã estava na fronteira.
Tenho que dizer que meter o carimbo de saída e atravessar a fronteira em direção ao Nepal foi um alívio enorme. A Índia foi uma experiência bizarra. No finalzinho eu estava começando a vislumbrar que o povo pode mesmo viver em condição que a gente julga como das piores possíveis e achar bom... nem pensando em religião, só de viver um tempo vc ve como é possível calejar contra tudo... aí vem, é claro, religião, costumes, tradições, contrastes... ladrões, caloteiros, mendigos... um mundo a parte... saía pro Nepal sem nem saber como era, mas no benefício da dúvida já era muito bom... pra quem vai pra Índia: 1-paciência, 2-mais paciência, 3- esforça o bom humor... A Índia que a gente imagina, Shiva, os deuses, as roupas coloridas, existe, mas é muito mais bonita na nossa cabeça do que quando a gente chega lá...
Aí, pra completar a farra, atravessei a fronteira e já tomei 3 ceverjas Carlsberg, minha favorita, na garrafa de 600 ml!! uhu!! que saudade!! Na índia é difícil de achar cerveja!! Aí mudei de idéia e fui pra Kathmandu, onde passei 2 dias dedicados a relaxar o espírito depois de uma semana de correria após 10 dias de lentidão total... passeei muito pouco, tomei mais umas cervejas, troquei idéia com o pessoal do hotel. Comprei minha passagem pra Thailandia e, como a gente não pode ficar parado, vim pra Pokhara...
Depois de uma viagem alucinante pelos himalaias, olhando pra baixo sem nem poder ver o fundo do buraco, cheguei, vi um lago verdinho, os raios do sol escondido atrás das nuvens refletindo na água, paragliders colorindo o céu e montanhas de neve no horizonte... era tudo que eu precisava... alguma coisa em que é preciso procurar pra achar defeito, e não o contrário... passei só um dia aqui, então deixo uma descrição mais completa pro próximo post...
agora são 15 dias no Nepal... treking, paraglider ou rafting!? TODOS!!
Reli o texto e vi que começou pra ser Delhi Agra e Varanasi, mas ficou mais Agra e Varanasi e um pouco da fronteira... isso é uma evidência de que Delhi é realmente um saco... hehehehehe
E foi mal aê galera... não to conseguindo fazer um post com um tamanho razoável... é drops ou um texto enorme!! ;)
Abaixo, fotos do que se passou, e algumas também do curso de meditação!
sábado, 6 de outubro de 2007
Delhi-Agra-Varanasi
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4 comentários:
que delicia essa viagem teo...saudades....bjo
Cada vez mais interessantes seus posts... nao incomoda passar 15 minutinhos lendo, até pq parece um livro bom.
Beijao e boa sorte em tudo!
Savana
Maneiro. Gostei.
O individualismo de uma trip individual (e eu ja pensei bastante sobre isso) na minha opiniao nao supera o aprendizado de compartilhar e decidir ideias tao imensas em conjunto. Eh aprender para vida. Abrir mao sem abrir ou entender uma outra maneira de ver.
Acho que isso eh uma coisa que vai ser perda na sua. Mas nada demais, sempre perdas e ganhos.
Por exemplo o Tushita. Vamos ficar separados, mas vamos em 3. 3 maneiras de ver, sentir e reagir a conceitos simultaneos. Mais do que compartilhar isso numa mesa de bar daqui a meses, vamos fazer isso no dia seguinte a saida, ou mesmo em um olhar durante a noite. vc tem que cuidar para valorizar isso. A viagem precisa de muito para se completar.
Estamos na India e na realidade de Delhi. A poesia da escrita dificilmente reflete a realidade. Eh sujo, eh mal cheiroso e maltratado. A cultura e diferenta, as crencas interessantes, mas a maneira de viver e triste como um dia chuvoso.
Se cuida, boas aventuras no nepal! Cortado do nosso roteiro, pelo visto. Sem recentimentos. Africa do Sul com certeza valeu, nao uma, mas duas penas!
Surfei em JBay!
eu pensei tbm, e acho que perco alguma coisa, mas em geral acho ainda que e melhor passar a maior parte do tempo "sozinho" o simples fato de ter que decidir e uma desgraca... quando vc ta sozinho vc nao tem que decidir nada, e so ouvir a tal da voz do coracao!! pergunta pro playboy como foi a decisao de qual trilha a gente ia fazer!! Mas, a maior licao e de que tudo e bao!! Aproveita o Tushita ae!! E doido demais!!! Encontrei algumas pessoas do meu curso aqui no Nepal, e muito engracado!!
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